domingo, 13 de outubro de 2019

Suspenso

Por uma corda estou suspenso
E o filme da minha vida toca
Meu peito apertando por dentro
Enquanto a angústia se esgota

Meu corpo fica dormente
E eu sinto vergonha e culpa
Perdão, meus amados entes
Essa sub-vida não vale a luta

Hipnotizado pelos meus fracassos
Isolado pelo meu medo
Mergulhado em estupor profundo
Trilhando outra vez esses passos
Que sempre trilhei em segredo
Descendo em direção ao fundo

Minha visão desfocada e branca,
Vejo olhos que me desprezam
Sinto saudades inúteis
A última lágrima sangra

Os últimos suspiros se quebram
Alívio e pânico chegam
Corpo e mente em conflito intenso
Nada mais importa pois

Por uma corda estou suspenso

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Você

Daqui a uma eternidade,
Num futuro distante,
Eu curvado sob o peso da idade,
Meu passado apenas um instante,
Lembrar-me-ei dessa felicidade
Arrancada das minhas mãos,
Aprendi com essa dor fria,
Fiz-me sábio na solidão.
Vivi essa vida longa,
Todos meus medos conquistados,
Derrubei meus próprios muros,
Desfiz-me de meus fardos,
E tendo vivido isso tudo,
Olhando para trás na vida,
Nunca pude superar
Tua súbita partida.
Satisfeito e realizado,
No auge do meu ser,
Eu ainda preferia não ter ficado
Sem você.

domingo, 22 de setembro de 2019

Abismo

De novo eu me vejo olhando
Para o abismo do meu vazio,
Minhas amarras cortadas,
Sem parapeito entre mim e o infinito,

Já esqueci meus sonhos,
Pus fogo em todas pontes,
Restaram-me devaneios medonhos
De profundezas sem horizontes,

Minha mente dissocia,
Me vejo fora de mim
Mesmo, minha única fantasia
É a serenidade do meu fim,

E eu todo angústia,
Desolado, inofensivo, desprovido
De vitalidade e força,

Um feto sem útero,
Apodrecendo ainda vivo,
Cada suspiro me empurra sutilmente
Para a eternidade

quarta-feira, 3 de maio de 2017

A Fonte da Nossa Angústia

A fonte da nossa angústia,
Que sobrepõe as virtudes mais básicas,
É o quadro incompleto que ilustra
O conjunto das nossas lástimas.

O ódio que inunda e guia
A visão parcialmente cega
Do prisma da nossa espécie
Corrompe a nossa empatia,
Nossa única força, nega,
Nossa unidade, enfraquece.

Corações vazios que esqueceram como se vive,
Separados da sua origem, isolados na multidão,
Tocados rumo ao abismo que inibe
Sua única fonte de salvação.

Eles clamam pela mudança
Do fracasso das suas histórias
Do único jeito que sabem,
"Queremos sangue em abundância"
Na vã esperança
Da cósmica balança
Não pesar igualmente para todos.

Pois no fundo sabemos
Que a fonte da nossa angústia
É nossa cúmplice íntima,
E a sua fome por mais vítimas,
Que nos vicia em não sentir culpa,
Irá finalmente obliterar
Tudo que conhecemos.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Nesse Dia

Só no dia em que seu pesar for tanto
E seu coração despencar através da sua alma,
Suas dores atravessando-te de uma só vez -
Um último gosto antes da calmaria eterna.

No dia em que seu coração rolar terra abaixo
E suas lágrimas se perderem no caminho para os seus olhos,
Seu eu estará completo e você, imune,
Seu ego totalmente fechado, sua culpa impune.

Só nesse dia você será livre,
E só assim você saberá quem é de fato,
Quando suas mágoas se destacarem
Da sua alma podre, seus vícios já além
De qualquer ajuda, você já extinto.

Quando seu coração se soltar
E você deixar de sentir,
O mundo preencherá
O vazio dentro de ti.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Autoconfiança

São sempre esses olhos no silvo da madrugada,
Tateando a imaginação às cegas
Na busca por apoio,
O núcleo da minha angústia envolto em trevas,
A provocação do sonho,
As frustações que não me ajudam em nada.

A calmaria é súbita.

E de repente eu não sou mais
A vergonha das minhas memórias
Nem a ausência das minha vitórias,
Sou só aquilo do que for capaz.

E eu me sinto eu mesmo novamente.
Todo eu plenitude, nascido dos escombros
Da minha auto-imagem, o coração quente
Envolto em seus fios longos
Que não deixam-me ver a direção em que me movo.

E sem perceber eu resolvo
Que vou me machucar de novo.

sábado, 27 de setembro de 2014

Constante

Ensurdecedor. As vozes não param,
Sequências batidas de dores vívidas,
O fechar da garganta, o sufoco súbito,
O aperto e a ânsia, a fúria sem objeto.

E as cores que vão-se indo,
E o pesar da alma já tão familiar,
A melancolia que te acalma,
O brilho dos olhos já findo,
Já acostumado a se desesperar
Surdamente pelos cantos da própria alma.

A sensação de estar prestes a ceder,
E saber o perigo que há em si
Por ser ferido e saber sobreviver,
Mas qual o sentido em insistir?

E acompanhar impotente a desilusão absoluta
Que se apresenta implacável até o gelar dos ossos.
Assistir a vida ser consumida pelo vazio das ações
E ver o mundo definhar até seus últimos destroços.